
Da Degradação à Sustentabilidade - Gestão Estratégica e Tecnologias Limpas para a Recuperação Hídrica e Ambiental.
PARQUE PITUAÇU
O Parque Metropolitano de Pituaçu, ou simplesmente Parque Pituaçu, está localizado no bairro de Pituaçu, em Salvador, fazendo fronteira com os bairros Boca do Rio, Patamares, Piatã, Imbuí e Centro Administrativo da Bahia (CAB).
Este parque, que inicialmente tinha 660 hectares, foi criado pelo Decreto Estadual nº 23.666, de 4 de setembro de 1973 e, através do Decreto nº 23.113, de 12 de abril de 1978, durante o governo estadual de Roberto Santos, então com 425 hectares, foi declarada a utilidade pública do terreno para desapropriações.


Atualmente, o Parque Metropolitano de Pituaçu abrange uma área de 392 hectares de área preservada, onde já foi catalogada uma grande diversidade de mamíferos, aves, répteis, anfíbios e peixes, sendo, ainda, a maior reserva ecológica da cidade de Salvador, Bahia.
Remanescente da Mata Atlântica, Pituaçu é um dos raros e mais belos parques ecológicos brasileiros situados dentro de área urbana. Ele tem uma infra-estrutura que permite, ao mesmo tempo, o uso pela população e a preservação do espaço, que é a maior área verde de uso público de Salvador.[1]
Contando com remanescentes de Mata Atlântica, com sua fauna e flora diversificadas, além da beleza de sua lagoa, teve seu auge nos anos de 1990, como um dos principais pontos de lazer dos soteropolitanos e turistas, além de servir como fonte de renda para os batalhadores e batalhadoras que moram no perímetro.
O local ainda conta com duas quadras poliesportivas, ciclovia, pista de patinação e skate, parque infantil, píer para pedalinhos, onde, inclusive, funcionava a Associação de Remo de Salvador, que desenvolvia excelentes projetos sociais.[2]
O Parque de Pituaçu também possui trilhas ecológicas e espaços para eventos culturais e esportivos, inclusive, para o exercício e atividades radicais, como “treinamento de sobrevivência em mata” para estudantes de aviação civil. Todavia, com a degradação e o abandono, o espaço não oferece segurança para seus frequentadores.
A Lagoa de Pituaçu (a maior da área metropolitana de Salvador com dois quilômetros quadrados/200 ha), foi formada artificialmente, em 1906, para servir de manancial de abastecimento da cidade, a partir do represamento do rio Pituaçu, até então um volumoso afluente do Rio das Pedras. Entretanto, a lagoa passou por um vasto processo de degradação que obrigou a suspensão do uso de suas águas para abastecimento.[3]
Em 2006, foram plantados exemplares de pau-brasil, aroeira, pau-pombo, jenipapeiro, cajá, mangaba, cedro e ipês roxo e amarelo, visando repor a área da mata perdida. Há uma pista de treinamento para aeromodelismo, construída na gestão de Mário Kertész, que está abandonada.[4]
O Parque de Pituaçu vem sofrendo um acelerado processo de degradação e abandono, como a supressão de vegetação do bioma Mata Atlântica, redução da área do parque por decretos estaduais, com as obras de Mário Cravo Júnior (escultor, gravador, desenhista, professor e modernista baiano), o Espaço Mário Cravo e o Parque das Esculturas em avançado processo de deterioração, além da insegurança, ocasionada pelo drástico corte no efetivo de proteção, etc.
Estes não são os únicos episódios de degradação do Parque Metropolitano de Pituaçu. Nos últimos meses, a população que reside e transita no seu entorno, que compreende os bairros Jardim Imperial, Boca do Rio, Imbuí, Pituaçu, a comunidade do Bate-Facho e os condomínios residenciais, empresariais e universitários da Rua Jairo Simões, tem presenciado um desmatamento acelerado desde o platô do Parque.
Essa degradação ambiental tem provocado um aumento da temperatura e da sensação térmica nesta região, além da diminuição da ventilação natural, fatores que contribuem para a intensificação do impacto das mudanças climáticas no conjunto da cidade de Salvador.
IMPACTOS AMBIENTAIS E CLIMÁTICOS
A vegetação existente na área do Parque Pituaçu exerce um papel fundamental na regulação térmica e na manutenção da umidade do ar na Cidade de Salvador. A derrubada de árvores reduz a capacidade da região de mitigar o calor, resultando em temperaturas mais elevadas e agravando o desconforto térmico da população.
O desmatamento compromete os corredores de vento que refrescam áreas urbanas densamente povoadas, como Pituaçu, Imbuí e a Boca do Rio. A ausência de vegetação também acelera processos erosivos, prejudica a fauna local e reduz a capacidade de absorção de águas pluviais, o que pode aumentar o risco de alagamentos em períodos chuvosos.
Os 18 quilômetros que ligam a região do Iguatemi à divisa de Salvador com Lauro de Freitas, por onde passam diariamente cerca de 200 mil veículos (ida e volta), traz alto grau de poluição ao meio ambiente local, agravando a degradação das áreas verdes do seu entorno, que abrigam espécies em extinção, tanto da fauna quanto da flora.
Entretanto, esta biodiversidade pode estar com os dias contados, já que esse perímetro, chamado de "Novo Centro-Alphaville", um nobre vetor da expansão urbana, encontra-se no radar de interesses da especulação imobiliária, cuja lógica é o desmatamento para dar lugar a novos empreendimentos e condomínios residenciais e empresariais.
Lembremo-nos de que a construção do metrô de Salvador na Avenida Paralela, realizada pela empresa CCR Metrô, reduziu a área verde local para dar passagem aos trilhos, retirando várias árvores do canteiro central, além do aterramento de lagoas e rios dessa avenida.
A existência dos inúmeros riscos ambientais encontrados atualmente na cidade de Salvador, advém de sucessivas segregações espaciais, oriundas de longas datas. Já no início do século XX, deu-se início à tendência da ocupação urbana desordenada, seguindo-se a mudança do novo centro financeiro e comercial da cidade e o surgimento dos shoppings centers.
Por um lado, essa expansão demográfica ampliou a maioria dos riscos ambientais na cidade de Salvador, com seus mares de morro, encostas íngremes, solos susceptíveis a deslizamentos e desmoronamentos e portadora de um regime de chuva tropical, com maior concentração no outono e inverno, contribuem para a desestabilização da maioria do tipo de solo, que por sua natureza já tem pouca estabilidade.
Por outro lado, a carência de canalização da rede de esgoto e o descarte irregular de lixo a céu aberto, além dos maus procedimentos decorrentes desse modelo de urbanização e especulação imobiliária, por exemplo, influenciam sobretudo a ampliação destes riscos ambientais.
O elevado número de ocupações nas áreas verdes, encostas e em terrenos instáveis, fora do ordenamento do uso do solo urbano, sem um plano diretor e sem a aquisição de equipamentos técnicos para o embasamento arquitetônico, reforça ainda mais a deterioração desse grave quadro.
A maioria dos solos encontrados nas áreas de riscos do município estão localizadas em áreas de escarpa de falha, com intenso teor de argila e silte, dotado de pouca espessura, como é o caso do platô do Parque Metropolitano Pituaçu, concorrendo para a degradação ambiental, com a incidência de deslizamentos, principalmente nos períodos de maior concentração das chuvas.
A qualidade ambiental da capital baiana tem se depreciado gradativamente. Lagoas e rios urbanos estão degradados, as dunas e manguezais impactados pelo crescimento imobiliário, a perda da cobertura florestal interfere na temperatura e umidade urbana.
Tudo isso em um contexto global de emergência climática, cuja crise ambiental resulta do aquecimento global, causado principalmente pela liberação de gases poluentes. Nesse sentido, cidades costeiras, como Salvador, devem ampliar suas políticas ambientais para reduzir os efeitos da crise climática.
DE QUEM É A RESPONSABILIDADE PELA CONSTRUÇÃO IRREGULAR NO PARQUE METROPOLITANO DE PITUAÇU?
A principal questão que se coloca é: quem autorizou essa movimentação de terra, pavimentação e construção de um muro que cerca o terreno no platô do parque? Essa obra possui licença ambiental? Se sim, qual foi o critério utilizado pelos órgãos responsáveis para permitir uma ação que claramente compromete a qualidade de vida da população e a sustentabilidade do ecossistema local?
Os órgãos ambientais municipais e estaduais, como a Secretaria Municipal de Sustentabilidade, Resiliência, Bem-estar e Proteção Animal (SECIS), a Secretaria Estadual de Meio Ambiente (SEMA) e o Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (INEMA), deveriam fiscalizar rigorosamente qualquer ação que resulte em degradação ambiental. No entanto, até o momento, pouco se sabe sobre a postura dessas instituições diante do desmatamento no platô do Parque Pituaçu.[5]
A Prefeitura Municipal de Salvador, por sua vez, o que tem feito? Como tem se posicionado sobre essa situação? Existe um plano de recuperação ambiental para a área? Essas são questões que a população exige respostas urgentes.
O QUE DEVE SER FEITO?
Em vez de permitir ou facilitar o desmatamento de uma área de importância ambiental, como o Parque Metropolitano de Pituaçu, os poderes públicos municipais, estaduais e federais deveriam priorizar ações que fortaleçam a preservação do Parque e da Lagoa de Pituaçu. Algumas medidas fundamentais seriam, entre outras:
Plantio de mais árvores no perímetro afetado para compensar a degradação já causada;
Criação de políticas públicas para a manutenção e revitalização da Lagoa de Pituaçu, garantindo sua preservação como um dos pulmões verdes da cidade;
Fiscalização rigorosa de obras que possam comprometer a biodiversidade local;
Incentivo a projetos de reflorestamento urbano e educação ambiental para a população;
Anexação da Lagoa de Pituaçu ao “Plano Setorial para os Recursos do Mar” (PSRM) e ao “Zoneamento Ecológico Econômico Costeiro” (ZEEC).
A cidade de Salvador, que já sofre com os impactos das mudanças climáticas, precisa avançar para um modelo de desenvolvimento sustentável que respeite, valorize e integre suas áreas verdes, promovendo empreendimentos e negócios sustentáveis, bem como o bem-estar de sua população.
A DEGRADAÇÃO AMBIENTAL E A IMAGEM DA GESTÃO MUNICIPAL
A ocupação desordenada do platô do Parque Metropolitano de Pituaçu, agredindo a Lei Ordinária nº 9774/2023, Lei de Uso e Ocupação do Solo (LUOS), que dispõe sobre o ordenamento do uso e da ocupação do solo do município de Salvador, detalhado nas diretrizes impostas pelo Plano Diretor, não só prejudica diretamente os moradores da região, como também depõe contra a gestão municipal de Salvador.
É preciso uma união de esforços entre instituições públicas, instituições sociais, organizações não governamentais e comunidades para que tanto as invasões de colarinho branco quanto as de baixa renda sejam combatidas.
A cidade de Salvador, que deveria ser referência na preservação de seus recursos naturais, assiste passivamente a mais um episódio de degradação ambiental sem transparência e sem um plano claro de mitigação.
Diante da iminência da COP 30, que será realizada em 2025 em Belém, Pará, essa situação deve ser denunciada internacionalmente. O compromisso ambiental das cidades brasileiras estará em evidência, e a forma como Salvador, a “Cidade Azul”, lida com suas áreas verdes, será um reflexo do verdadeiro comprometimento da gestão pública estadual e municipal com as questões das mudanças climáticas e o futuro do planeta.[6]
UMA RESPOSTA INSTITUCIONAL À CRISE CLIMÁTICA
Diante da grave situação de desmatamento no Parque Metropolitano de Pituaçu, além dos impactos ambientais que outras degradações vêm causando no Estado da Bahia em geral e em Salvador, em particular, torna-se urgente uma ação coordenada para a preservação ambiental e a mitigação dos efeitos das mudanças climáticas.
Nesse sentido, sugerimos a criação de um órgão ou secretaria específica para a “Gestão das Mudanças Climáticas”, nos âmbitos da gestão pública estadual e municipal. Esse novo organismo teria como missão desenvolver políticas públicas para adaptação e mitigação dos efeitos das mudanças climáticas, garantindo a proteção das áreas verdes, a preservação dos recursos hídricos, a captação de investimentos, investidores e negócios nas áreas de tecnologias limpas, com vistas à redução da vulnerabilidade socioambiental da população baiana.
Essa estrutura poderia operar com as seguintes diretrizes:
1. Interlocução com os Poderes Públicos:
Atuação conjunta com as secretarias municipais e estaduais de meio ambiente, urbanismo, infraestrutura e desenvolvimento econômico.
Diálogo com o governo federal para acessar programas de financiamento climático e ações do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima.
Articulação com o Legislativo para a criação de leis que incentivem a transição ecológica e a sustentabilidade urbana.
2. Parceria com o Setor Empresarial:
Engajamento do empresariado local e nacional na implementação de soluções sustentáveis, como investimentos em energias renováveis, compensação ambiental e reflorestamento urbano.
Criação de incentivos para empresas que adotem práticas sustentáveis e reduzam sua pegada de carbono.
Parcerias com instituições de ensino para a criação de cursos de extensão direcionados à formação de novas competências e habilidades relacionadas às mudanças climáticas.
Criação de um Hub de Negócios Sociais e Ambientais;
Criação de um Selo Verde para premiação das melhores práticas de sustentabilidade dos órgãos públicos, empresas e instituições sociais.
3. Cooperação com Organismos Internacionais:
Estabelecimento de parcerias com instituições como a ONU, OCDE, Banco Mundial, BID, BRICS, entre outros, para acessar fundos climáticos e programas de financiamento ambiental.
Participação ativa nas conferências do clima (COP) e adesão a pactos internacionais que promovam o desenvolvimento sustentável nas cidades.
4. Ações Locais e Participação Social:
Implementação de programas de reflorestamento e recuperação de áreas degradadas, como o próprio Parque Metropolitano de Pituaçu.
Incentivo a iniciativas comunitárias e educação ambiental para a população.
Transparência e participação popular na definição de políticas ambientais.
A criação desse organismo representaria um avanço significativo na governança ambiental, alinhando o Estado e os municípios às melhores práticas globais de enfrentamento à crise climática. Sem uma resposta institucional robusta, casos como o desmatamento no Parque Pituaçu continuarão a se repetir, comprometendo o futuro ambiental da cidade e do estado.
Concluindo, diante dos desafios impostos pela crise climática e suas repercussões diretas na escassez hídrica, torna-se essencial a implementação de um órgão público de “Gestão das Mudanças Climáticas”, fundamentado nos princípios da Inteligência Organizacional e da Gestão do Conhecimento.
Esse órgão deve atuar de forma estratégica na busca de soluções inovadoras para os problemas ambientais que afetam os corpos d'água de Salvador, como a Lagoa de Pituaçu e outras lagoas, rios e mares, enfrentando fatores como o aumento da demanda por água, eventos climáticos extremos, precariedade da infraestrutura hídrica e altos índices de poluição de mananciais.
Para isso, propomos um modelo de governança transdisciplinar que integre tecnologias sociais e ambientais limpas, fomentando negócios sustentáveis adaptados à realidade econômica e social da população local.
Entre as soluções viáveis, destacam-se a recuperação e preservação de nascentes, a implementação de sistemas descentralizados de captação e reuso da água, o incentivo ao saneamento ecológico e a criação de cooperativas de economia circular voltadas para o tratamento e reaproveitamento de resíduos sólidos e hídricos.
Esse esforço conjunto entre poder público, setor privado e sociedade civil é fundamental para garantir a resiliência hídrica e ambiental do município, assegurando o direito à água para as gerações presentes e futuras.
Que esse debate não fique restrito às denúncias e protestos. Que ele gere ações concretas para proteger a biodiversidade, garantir qualidade de vida à população e posicionar Salvador e a Bahia como referências em sustentabilidade e resiliência climática.
Ricardo Justo é Professor, Político e Gestor.
[1] Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos - INEMA. Acesso em 18/03/2025.
[2] Prosas | Empreendedor - Associação de Remo Salvador. Acesso em 18/03/2025.
[3] http://www.inema.ba.gov.br/wp-content/uploads/2011/10/folder_pituacu.pdf. Acesso em 18/03/2025.
[4] O caminho das águas em Salvador - Bacias Hidrográficas, bairros e fontes | Portal Conder. Acesso em 18/03/2025.
[5] Invasões do Parque Metropolitano de Pituaçu exigem ações urgentes | Ministério Público do Estado da Bahia. Acesso em 18/03/2025.
[6] https://ricardojusto.com.br/. Acesso em 18/03/2025.
PARQUE PITUAÇU
Da Degradação à Sustentabilidade - Gestão Estratégica e Tecnologias Limpas para a Recuperação Hídrica e Ambiental.
Parque Pituaçu - Da Degradação à Sustentabilidade - Gestão Estratégica e Tecnologias Limpas para a Recuperação Hídrica e Ambiental
O Parque Metropolitano de Pituaçu, ou simplesmente Parque Pituaçu, está localizado no bairro de Pituaçu, em Salvador, fazendo fronteira com os bairros Boca do Rio, Patamares, Piatã, Imbuí e Centro Administrativo da Bahia (CAB).
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